sábado, 12 de abril de 2008

Tudo o que faremos quando tu voltares

(dos Contos Pampianos de Alma Welt)


Estás a caminho, Aline, eu já te vejo voltando. Recebeste minha carta, e respondeste com um lacônico bilhete, mas tão sugestivo, que foi o suficiente: meu coração se iluminou. Estarei sonhando? Interpretei tuas poucas palavras pela ótica da minha apaixonada esperança? Não creio. Eu sinto teus passos na estrada, na longa estrada que nos separou. E meu coração segue o compasso dessa tua caminhada em direção aos meus braços, à minha alegria recuperada.
Lembra, Aline, nossas noites infinitas, quando derramávamos lágrimas de embevecimento, e da pura alegria do nosso encontro nesta vida? Como apertávamo-nos em nossos braços esmagando nossos seios, aréola contra aréola. Como nossos púbis se colavam, nossos ventres, nossos lábios? Como trocávamos nossos fluidos, como irmãs-amantes? Como definir senão assim, nossa intensa simbiose, nossa paixão indescritível? E, no entanto, partiste... quase me matando, pelo tanto que eu me confundira, me perdera ou... me ganhara em ti. O êxtase, Aline, o êxtase, nos o conhecemos nesta vida. E isso é santidade, Aline, a verdadeira santidade! Nada faltou no nosso amor carnal: lançamos mão de tudo, sem reservas, e nos possuímos como mulher a mulher, homem a homem, homem à mulher e andrógino a andrógino, com ajuda de artefatos, imaginação e ardor, Aline. Paixão anímica e carnal!
Vem Aline, estou de braços abertos e assim ficarei como uma crucificada, em espera, e esperança, na soleira de minha porta, na varanda do casarão de minha estância, até chegares, e te colocares entre meus braços, endurecidos e... adormecidos, que se dobrarão, afinal, sobre ti. Já querem me internar, Aline, mas não se atrevem. Algo em mim, no meu olhar, talvez, faz crer que tenho razão, que estás a caminho. E os outros esperam a comprovação de um milagre anunciado, como aqueles que querem ver para crer. Ó, seres de pouca fé! Então não ouvem teus passos? Pensam que estou louca...
Quando voltares, te levarei nos meu braços, para que conheças meu florido jardim, meu pomar e minha macieira gravada a canivete AR, onde acrescentarei o teu A, transformando ar, em pedra sagrada. Ara dos Pampas, será o teu capítulo. Eu te levarei comigo com a maçã afinal colhida, ao meu rio, e ao meu bosque. E montarás na garupa do meu pampeiro, numa disparada infinita, pelas coxilhas, agarrada a mim por trás, que sentirei o teu corpo para sempre, mesmo apeadas, nuas, tu colada a mim, na frente, atrás. Eu não te deixarei mais! Tu não me deixarás, porque eu te farei tão feliz que não mais te arriscarás a perder-me! Eu te possuirei e me possuirás até o sangue, até formarmos o Hermafrodita sagrado, com nossos corpos e nossa mentes incendiadas. A salamandra regerá as noites das nossas fogueiras, em plena pradaria preparando o mate que compartilharemos, o amargo, que nos saberá doce e que nos esquentará sob um pala compartilhado na noite sagrada e fria do minuano.
Não poderão mais apartar-nos; não ousarão mais, embora estarrecidos!

Ah! Tudo o que faremos, Aline, quando tu voltares!

21/04/2006

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